Mitologia dos orixás: um estudo dramatúrgico a partir da obra Os Orixás do Giramundo Teatro de Bonecos[1]

Artigo publicado na Revista Aluá – Revista de Cultura e Extensão Aluá. Ano 1 – N. 1 – 2017. p. 84 – 99. Pró-Reitoria Cultura, Extensão e Assuntos Estudantis da Fundação Universidade Federal de Rondônia 

Fonte das figuras: GIRAMUNDO. Arquivos: Baú e Os Orixás. Coletânea organizada por Rogério Sarmento. Belo Horizonte: Museu Giramundo, abr. de 2010. CD-ROM, 1 unidade física.

 

RESUMO: Neste artigo lanço um olhar sobre alguns mitos representados, dramaturgicamente, no espetáculo teatral Os Orixás, montado em 2001, em Belo Horizonte, pelo grupo de teatro de animação Giramundo. Este grupo, ao longo de quase cinquenta anos de existência, já representou, em seus trabalhos, distintas mitologias e lendárias do país: desde os contos da Iara, do Rio São Francisco – do norte de Minas Gerais -,  até as histórias do Boto da Amazônia. Contudo, as figurações mitológicas afrobrasileiras só foram aprofundadas quando da montagem desse trabalho. Entrementes, para compreendermos melhor tais mitos faz-se necessária, em primeiro lugar, uma observação sobre a escravidão de africanos no Brasil Colônia e sobre as contribuições dos negros para o surgimento e consolidação das crenças afrobrasileiras. Depois, importa observar como o culto aos orixás tornou-se o centro destas crenças e, por fim, de que maneira se deu a entrada do diretor Álvaro Apocalypse nesse universo, apropriando-se de aspectos mitológicos do culto aos orixás para elaborar a dramaturgia de tal espetáculo, baseando-se, principalmente, em mitos narrados no livro Mitologia dos Orixás, de Reginaldo Prandi.

 

Palavras-chave: teatro de bonecos, divindades, candomblé, umbanda, terreiro.

 

ABSTRACT: This article takes a look at some myths dramaturgically represented in the theatrical spectacle “Os Orixás”, mounted in 2001 in Belo Horizonte, in Giramundo Animation Theatre Group. This group for almost 50 years of existence, has represented in his works, different mythologies and legends of the country: the tales of Iara, the São Francisco River – from the north of Minas Gerais – to the stories of Amazon Boto. However, the mythological african-Brazilian figurations were only deepened when assembling this work. Meanwhile, to better understand these myths is necessary, first, a note about the enslavement of Africans in colonial Brazil and about the contributions of black people to the emergence and consolidation of african-Brazilian beliefs. Then it should be noted as the worship of orishas became the center of these beliefs and, finally, how was the entry of the director Álvaro Apocalypse in this universe, appropriating of mythological aspects of the cult of the orishas to develop the dramaturgy of such spectacle, mainly based on myths narrated in the book “Mitologia dos Orixás”, authored by Reginaldo Prandi.

Key words: puppet theater, deities, candomblé, umbanda, yard.

 

 Escravidão negra no Brasil

Em síntese, a escravidão de negros africanos no Brasil parece ser contemporânea à colonização do país, ocorrida no século XVI. Entretanto, o grande tráfico negreiro, conforme a historiadora Nina Rodrigues (1982), iniciou-se pouco menos de uns cinquenta anos após a chegada dos portugueses à nova Colônia. Nos séculos posteriores, o comércio colonial de escravos aumentou de forma acelerada, principalmente com a descoberta de ouro em Minas Gerais. Estima-se que até o final do século XVIII mais de um milhão de escravos foram introduzidos em nossas terras. Com eles vieram as suas culturas, seus valores, suas crenças e os seus deuses. De acordo com o pesquisador Volney Júnior Berkenbrock (1999), os escravos provinham das mais diversas culturas e povoados do continente africano, especialmente da costa ocidental. Segundo ele, isso provocou, antes mesmo da chegada dos escravos à Colônia, grandes misturas e confusões étnicas, culturais, religiosas e linguísticas. Tais misturas, somadas às separações familiares feitas pelos senhores de engenho, às dificuldades de comunicação entre membros das diferentes tribos, às proibições religiosas impostas pela Igreja Católica, dentre outras, causaram nas comunidades negras que chegaram ao Brasil Colônia muitas perdas, como foram, por exemplo, perda de parte dos rituais religiosos coletivos. Entretanto, o culto aos orixás, mesmo que individualmente — haja vista, segundo Berkenbrock (1999), o critério étnico não ser mais um fator determinante para a organização da nova sociedade na qual os negros se encontravam[2] —, se manteve após a abolição da escravatura, ocorrida no final do século XIX. Desse modo, a veneração aos orixás atravessou as primeiras décadas do Brasil República, e, novamente ganhando força coletiva dentro de pequenas comunidades constituídas principalmente nos centros urbanos — nas quais foram criados os primeiros terreiros —, chegou — por exemplo, por meio do candomblé e da umbanda — aos dias atuais.

Entretanto, para esse autor, apenas alguns poucos das centenas de orixás cultuados na África tornaram-se conhecidos no Brasil. E um número menor ainda foi cultuado. Além disso, aqui ocorreu uma aglutinação de funções religiosas que na África eram exercidas por pessoas distintas. O brasileiro, diferentemente do africano, assumiu sozinho o culto a variados ou a todos os orixás. Portanto, “o sistema africano de comunidades que se dedicavam ao culto de uma única entidade desapareceu completamente no Brasil. Em seu lugar, surgiram comunidades onde são cultuados diversos Orixás” (Berkenbrock, 1999, p. 113). Essas comunidades foram responsáveis pela fundação de inúmeras religiões, como o candomblé e a umbanda, que se transformaram, no território nacional, em religiões afrobrasileiras.

Mas afinal, o que são os orixás?

 O professor e pesquisador Alexandre Magno Teixeira de Carvalho traz em sua tese uma síntese bem interessante sobre os significados do termo. Assim, para ele, os orixás são

Divindades iorubás cultuadas nos Candomblés. (…) ancestrais divinizados, antigos reis ou heróis, e considerados como representações das forças da natureza (…); Divindades iorubá cultuadas nos candomblés, Xangôs, batuques, umbandas, isto é, nas religiões de matriz africana no Brasil. Seu equivalente Fom [Jejê] é Vodum, em Angola é Inquice. São também chamados de “santos” (…); Essas equivalências são imperfeitas, pois, ao passo que uns são forças da natureza, outros são espíritos que retornam sob a representação de animais, enquanto outros são ainda espíritos ancestrais (…); nome genérico das divindades, que são intermediárias entre Olorum, o deus supremo, e os mortais (…). (CARVALHO, 2004, p. 225).

Além disso, de acordo com Prandi (2001, p. 20), os iorubás[3] tradicionais e os seguidores de sua religião nas Américas acreditam que

os orixás são deuses que receberam de Olodumare ou Olorum, (…), o Ser Supremo, a incumbência de criar e governar o mundo, ficando cada um deles responsável por alguns aspectos da natureza e certas dimensões da vida em sociedade e da condição humana.

Esse autor diz ainda que os iorubás acreditam que os seres humanos são descendentes desses deuses. Assim, cada um herdaria do orixá de que procede suas impressões e particularidades, tendências e desejos. Isto tudo de forma parecida ao contado em seus mitos. Talvez estejam aí as explicações para os múltiplos temperamentos dos humanos.

Finalmente, para o pai-de-santo Dagoberto Silva, na obra Magia e Rituais de Umbanda, os orixás, na umbanda, não são deuses, mas “apenas ministros de OLORUN, delegados divinos encarregados de resolver os problemas humanos” (SILVA, 196-?, p. 09).

Apresento agora mais duas questões: como os orixás se manifestam e onde podem ser encontrados?

Em suma, conforme o que é narrado em alguns mitos afrobrasileiros, essas entidades podem se revelar no corpo dos humanos, nos elementos da natureza (como em raios, trovões, tempestades, ventos, chuvas, arco-íris, névoas, etc.), em espíritos que tomam forma de plantas e animais ou até mesmo em espíritos de ancestrais, e assim por diante. Como os orixás são muitos, e de certa forma são oniscientes e onipresentes, podemos sentí-los — ou até mesmo vê-los — em diversos lugares: nas margens dos oceanos, rios e lagos; nas cidades; nos campos e florestas; nas pedreiras; nos hospitais; nos funerais; nos cemitérios; nas encruzilhadas; nas fontes de água; nas festas; na força dos materiais, como os instrumentos agrícolas e armas; nos formigueiros; em fogueiras; nos terreiros; etc.

Diga-se de passagem, conforme o pesquisador, fotógrafo e etnólogo franco-brasileiro Pierre Verger (2000), o culto a essas entidades, chamadas na língua iorubá de Oriṣa,[4] são dirigidas, inicialmente, às forças naturais, por meio de antepassados transformados em deuses, e constituiriam um amplo sistema que liga os mortos e os vivos de forma ininterrupta. Destarte, por ser a ligação mística entre os orixás e os humanos sempre constante e ativa, nada se faz, aqui na terra, sem consultá-los e sem ter por certo suas proteções. Para tanto, é preciso agradá-los, caso contrário, destruições sem tamanho podem acontecer, pois “os deuses são terríveis e temíveis, mas se convenientemente tratados, adorados, proporcionam ajuda e proteção a seus fiéis. Basta conformar-se à lei, à regra, e não se sofrerá as conseqüências”. (Verger, 2000, p. 16). O Giramundo, antes das apresentações do espetáculo Os Orixás, parece agradar a esses deuses, com a prática de incensamento do espaço de representação, evitando, desse modo, maiores constrangimentos durante o acontecimento teatral.

Quanto aos principais locais de adoração aos orixás aqui no Brasil, pelo notado nos autores mencionados, são os terreiros. Ao que parecem, estes espaços lidam bem com as diferenças: aceitam adeptos de todas as cores de pele, profissões, classes sociais e crenças religiosas. Assim, os artistas Álvaro Apocalypse e sua filha Beatriz Apocalypse não encontraram muitas dificuldades para serem aceitos pelo Grupo Espírita Estrela do Oriente – Casa Raiz do Bate Folha[5]. Tampouco se depararam com obstáculos para receberem ajuda de Henrique Neto (Tateto Kitulangê), zelador ou pai-de-santo[6] desse centro, para a montagem da peça teatral Os Orixás, em 2001. Esse babalorixá os municiou de informações relativas à umbanda e ao candomblé: mitos, cantos, instrumentação, orixás representados e seus arquétipos. Logo, Tateto Kitulangê foi elevado à condição de assessor da montagem, para os assuntos relativos às mitologias iorubás.

Enfim, foi numa sexta-feira que Álvaro e Beatriz Apocalypse se encontraram e se encantaram, no terreiro do Estrela do Oriente, com Oxalá, o deus da criação.

 

Uma rápida viagem pela encenação do Giramundo

 Em suma, isto nos conta Álvaro Apocalypse, por meio de Os Orixás: Olodumaré, o deus supremo, pede a seu filho Oxalá, o grande orixá, para criar a Terra, o homem e a mulher. No entanto, aproveitando a embriaguez do irmão Oxalá, causada por Exu, o dono das encruzilhadas e guardião do Portal de Orum (o Além), Oduduá, deusa da Criação, pega o saco da criação e dá existência ao universo. Aborrecido, enciumado e com medo de não ser lembrado na história da História, Oxalá se reporta ao pai, que o autoriza a criar um casal de homem e mulher. Depois de criá-los, o casal — Okunrin (que significa homem) e Obinrin (o mesmo que mulher) — se afasta por intriga de Exu. Uma mãe-de-santo (Ialorixá[7]) convoca Exu e lhe oferece um Ebó (oferta ou sacrifício) para que ele junte o casal que separou. Novamente juntos, o casal tem um filho: Omobinrin. Finalmente, a Terra ficava cada vez mais povoada, deixando Olodumaré tão contente que inundou o mundo de luz.

Os Orixás é o trigésimo trabalho do Giramundo e a última montagem de Álvaro Apocalypse, falecido em 2003. Além da concepção do texto e da cenografia, ele também fez a direção geral, enquanto a sua filha Beatriz Apocalypse fez a direção de cena.

Espécie de tributo às culturas afrobrasileiras a partir de seus aspectos artístico-culturais e mitológicos, Os Orixás, sem proselitismos, narra mitos provenientes do panteão de deuses africanos sobre a gênese da criação: do universo, da terra e das primeiras vidas, principalmente dos seres humanos. Grosso modo, a peça aborda, também, as paixões que moveram as atitudes desses deuses. Além disso, de certa maneira, destaca ainda a importância dessas culturas para a constituição das culturas brasileiras: suas músicas, danças, culinárias, religiões, línguas, etc. Ademais, completaria um ciclo de espetáculos do Giramundo que representam, de forma objetiva, elementos culturais do Brasil. Tal ciclo ter-se-ia iniciado com o Saci Pererê (1973) e se estenderia para Um Baú de Fundo Fundo (1975), Cobra Norato (1979), Auto das Pastorinhas (1984), O Guarani (1986), Tiradentes (1992) e A Redenção pelo Sonho (1998).

Álvaro Apocalypse, justificando a escolha do tema da nova peça, disse o seguinte:

A cultura negra é muitas vezes excluída (…). Os índios, por exemplo, são constantemente lembrados, recebendo nomes de ruas e afins. Mas os africanos são mais esquecidos. Eles também formaram nações, com identidade, língua e costumes próprios. Eles deixaram vários traços em nossa cultura.[8]

Com tal afirmação, Apocalypse parecia mostrar que, em Belo Horizonte, pelo menos no que se refere aos nomes de ruas do centro da cidade, as culturas africanas não foram devidamente lembradas. Enquanto determinadas ruas foram homenageadas com nomes indígenas, como, por exemplo, Rua dos Tupis, dos Guaranis, dos Guaicurus, dentre tantas outras, não se nota nenhuma menção a topônimos africanos, pelo menos nessa região. Dessa forma, a montagem de Os Orixás, além dos aspectos anteriormente mencionados, também parece cobrir um pouco esse vazio, ademais de preencher uma lacuna no palco das marionetes do Giramundo. Contudo, ao decidir montar esse espetáculo, um dilema parece ter tirado o sono do diretor: “como contar uma história que não se conta, que é vivida; em outras palavras, que só é dita por quem a entende e só é entendida pelos que não a querem desvelar?”.[9] Talvez seja por este motivo que o encenador recorreu a Henrique Neto, babalorixá do Grupo Espírita Estrela do Oriente: “Passei a ele várias lendas, costumes e tradições […]”.[10]

Beatriz Apocalypse, em entrevista, disse que o seu pai, ao decidir montar Os Orixás, queria retratar a mitologia africana e não a religião, como muitos acreditavam:

Algumas pessoas, às vezes, confundem com a religião, mas ele não quis retratá-la. Fez um período de estudo da mitologia dos orixás, da mitologia aplicada. (…) Então, foi um longo estudo. Um período bem interessante: as lendas são maravilhosas, os deuses são lindos. E a gente quis transpor isso para o espetáculo, para, de certa forma, homenagear os negros e levar para as pessoas que isso não é macumba, espiritismo, mas sim mitologia. (APOCALYPSE, B., 2009, entrevista concedida ao autor).

            Em relação a esse aspecto mitológico de Os Orixás, Beatriz Apocalypse tem certa razão. O seu pai se preocupou muito mais em narrar os mitos do que propriamente retratar os aspectos religiosos da umbanda, do candomblé e/ou do espiritismo. Ele também se atentou aos elementos artísticos dos cultos aos orixás: às indumentárias, às cores, aos paramentos, às armas e jóias utilizadas pelos deuses, assim como às gestualidades recorrentes em suas danças.

            Ainda sobre os estudos para a criação do espetáculo Os Orixás, Helvécio Carlos (2001), jornalista do jornal Estado de Minas, disse que Álvaro Apocalypse encontrou os fundamentos para sua pesquisa em obras como as de Pierre Verger. É dado que as investigações do diretor duraram aproximadamente dois anos: de 1999 a 2001. E foi nesse período que ocorreu uma surpresa: “Na hora que comecei a mexer foram aparecendo diversos livros sobre o candomblé, [como o] Mitologia dos Orixás”,[11] pondera o dramaturgo Apocalypse. Aliás, esta obra, escrita pelo sociólogo Reginaldo Prandi, foi lançada em dezembro de 2000, conforme informação disponível no sítio eletrônico[12] do próprio autor. Justamente pelo motivo de o espetáculo ter estreado um pouco mais tarde, em 11 de maio de 2001, além do fato de existirem várias versões do texto Os Orixás, o que demonstra dificuldades de Apocalypse nas escolhas dos mitos a serem representados, e finalmente pelos atrasos na produção e finalização da montagem, surge a hipótese de que a obra Mitologia dos Orixás tenha sido primordial para a finalização daquele texto.

Durante as pesquisas que realizei no Museu Giramundo, em Belo Horizonte, encontrei sete versões do texto Os Orixás. Contudo, somente uma delas, não sendo possível definir exatamente qual versão é, possui data: 04 de setembro de 2000. Encadernada a uma dessas variantes encontra-se o livro Orixás (1955), de Pierre Verger. Porém, neste livro, não se notam descrições de mitos, o que reforça ainda mais a hipótese de que a obra de Prandi foi fundamental para Álvaro Apocalypse.

O recém-inaugurado Teatro Giramundo, em Belo Horizonte, foi o “terreiro” que recebeu a nova peça, que ali cumpriu uma temporada quase que ritualística de mais ou menos dois meses: sempre às sextas, sábados e domingos. Mais tarde, alguns dias depois da morte de Álvaro Apocalypse, ocorrida em setembro de 2003, a filha Beatriz e os artistas Marcos Malafaia e Ulisses Tavares (outros integrantes do grupo) apresentaram uma remontagem da peça no Festival Mundial de Marionetes da UNIMA, em Charleville-Mezières, França.

 

A história de uma dramaturgia tecida pelos fios de mitos

 Agora, observarei de que maneira Álvaro Apocalypse dispôs, no texto Os Orixás, alguns mitos dos orixás, recriando e representando, textualmente, uma coleção mitológica afrobrasileira. Ademais, compararei as narrativas trazidas pelo artista com mitos contados por Prandi (2001), a fim de compreender melhor a influência deste último sobre a construção textual do primeiro.

Como vimos, Apocalypse fez um longo estudo sobre essa coleção e ainda acompanhou os ritos ao culto aos orixás, num terreiro da capital mineira, para tecer as linhas e enredar as histórias do seu texto. Assim, ao que tudo indica, além das inspirações em Mitologia dos Orixás, possivelmente o diretor registrou, em sua memória, narrativas que ouviu serem contadas e viu serem representadas, em forma de cultos, durante as reuniões do Grupo Estrela do Oriente.  

É difícil, senão quase impossível, reconstruir as pesquisas de Apocalypse e verificar todas as obras lidas e mitos coletados por ele para compor a coleção presente nas vinte e sete cenas do seu texto. De acordo com Malafaia (2009), foi muito grande o volume de leituras realizado pelo diretor. Em toda a cidade a que ia procurava por obras raras relativas aos mitos em sebos e livrarias. Mesmo a mitologia africana sendo muito extensa e complexa, ele “conseguiu fazer uma síntese que valoriza e contribui para o registro dos principais mitos desse panteão” (Malafaia, 2009, entrevista concedida ao autor). Nessa síntese constam, ao todo, histórias de dezessete orixás: Exu, Iansã, Iemanjá, Logum Edé, Nanã, Obaluaê/Omulu, Oxalá (Obatalá), Odé/Oxossi, Oduduá, Ogum, Olokun, Orumilá, Orungã, Ossaim/Katendê, Oxum, Oxumarê (serpente) e Xangô. Em cada uma das vinte e sete cenas de Os Orixás, o encenador/dramaturgo retratou uma ou mais narrativas relacionadas a esses deuses e às ações deles, e também apresentou ritos prestados a essas entidades. Entretanto, vale ressaltar que, além do texto, os ritos também são notados na partitura de ações dos bonecos/personagens e nas cantigas do espetáculo.

O texto Os Orixás é um dos elementos-chave da encenação do Giramundo. Contudo, ele não se nutre da lógica aristotélica, no sentido de encadeamento linear das ações (princípio, meio e fim), e não busca assertivas no mundo real. Tanto o texto quanto a encenação parecem se articular em torno de dois tempos principais: um mítico (atemporal) e outro narrativo.

Constituído por um único ato, se enovela por saltos espaciais e temporais — em forma de pequenos esquetes — e pauta-se, principalmente, em narrações: as figuras de dois narradores (um homem e uma mulher) revezam-se — ora um ora outro, ambos os dois — nos relatos dos fatos ocorridos e na apresentação dos mitos. Enfim, apresento e narro, resumidamente, alguns mitos representados no texto Os Orixás, relacionando-os, e por ora comparando-os, com mitos figurados em Prandi (2001). Além disso, teço comentários das cenas que considero mais relevantes.

As sete primeiras cenas de Os Orixás trazem mitos referentes à criação do universo e dos seres humanos e também sobre o surgimento de alguns orixás. São elas, respectivamente: “Ni Igba Kan[13], “Exu”, “Oduduá”,  “Okikishi e Iyê”, “Nanã”, “Egum” e “Obaluaê”. Por sua vez, estas encontram respaldos nos seguintes mitos narrados por Prandi (2001): “Orinxalá cria a Terra”, “Obatalá cria o homem”, “Nanã fornece a lama para a modelagem do homem”, “Nanã tem um filho com Oxalufã” e “Nanã esconde o filho feio e exibe o filho belo”.[14]

Mais ou menos assim começam as cenas: havia o nada antes da criação. Olodumaré/Olorum/Olodum (ser absoluto e inatingível), em quatro partes o mundo sonhou: Olokun (o Mar), Orumilá/Ifá (o Destino), Oduduá (a Terra) e Obatalá (o Céu). Olodum chama o filho Oxalá: “Êpa Babá, Oxalá[15]”; dá-lhe o saco da criação e pede para ele o mundo criar. Mas “Oxalá devia cumprir obrigação. Para ir além do Além, Orum. Pôs-se a caminhar. E encontrou Exu, guardião do Portal de Orum”.[16] No entanto, Oxalá, altivo e orgulhoso, passa direto pelo Portal e não deixa nenhuma oferenda para Exu. Logo, o guardião do Portal se vinga de Oxalá, causando nele uma grande sede. Este, sedento, vê um pote de vinho de palma e bebe sem parar, até ficar bêbado. Sonolento, o orixá deixa cair de suas mãos o saco da criação, perdendo-o.

Esperta, Oduduá pega o saco e semeia a semente da criação. Cria montinhos de terra e coloca uma galinha para ciscar, esparramando-a: “Um morro aqui. Um riozinho ali. Um lago. E lá adiante, uma cidade. Onde Okó, o homem, um dia há de morar.[17] Oduduá cria a Terra (Ilê-Aiyê), a água (Olokun), a terra firme (Aganju), o céu (Ojo Orum) — repleto de estrelas e de ar — e o fogo de derreter e esquentar.

Em outro momento, o deus Oxalá, depois do triste despertar, pergunta ao seu pai: “o mundo está pronto pronto, o que falta faltar?”[18] E Olodum responde: “Falta Okikishi, o sal da Terra, que chamarão: o Homem. Falta Iyê, a vida, que chamarão: Mulher. Pega então desta argila que te dou e modela o corpo de Okurin e Obinrin. E no calor do fogo, ponha os dois para secar”.[19] Então, Oxalá modela o barro e põe para queimar. Por um lado, o homem queima demais e fica preto. Por outro, a mulher queima pouco e fica branca. Em seguida, o curioso Orungã, o Vento, vem ver a obra de Oxalá. Ele venta tanto que racha o barro. E assim nasce a mulher. Mas foi Nanã, a mãe das águas paradas, dos lagos e dos pântanos, que deu a Oxalá, o seu esposo, o barro para fazer o homem. Todavia, quando a alma (Egum) do homem se for, Nanã pedirá o barro de volta.

 

NARRADORA: Nanã Buruquê domina o Egum,

Egum espírito do morto que morreu

E não foi pra lugar nenhum. (APOCALYPSE, A., 2010, p. 7).

Mais adiante, Oxalá pede para Nanã dividir com ele o poder sobre Egum Egum. Mas ela diz para Oxalá que o poder vem deles e não dela. Logo, não é possível realizar a partilha. Insistentemente, Oxalá tenta dominar os eguns, ao passo que acaba descuidando do seu casamento com Nanã. Ela então faz um feitiço: “Vinho de palma e cento e um caramujinhos. E um filho de Oxalá este feitiço vai me dar”.[20]

O feitiço faz efeito, nasce Obaluaê ou Omulu, “orixá da varíola, das pestes, das doenças contagiosas”.[21] Entretanto, ele nasceu feio, deformado, torto. Desesperada, a mãe atira o filho, nu, ao mar. Mas Okurin e Iawô (esposa jovem)[22] o salvam, tecendo para ele um manto de palha da costa chamado ganzé: “[…] com ele Obaluaê se cobriu e assim saiu da noite onde se escondeu. Tomou do Xaxará[23] e saiu pelo mundo com a missão de curar os enfermos e debelar as epidemias pelo resto das eras, épocas e tempos”.[24]

Comparemos o último mito, narrado por Apocalypse, com o mito “Nanã esconde o filho feio e exibe o filho belo”, transcrito por Prandi (2001, p. 197)). Os mesmos se diferem um pouco:

Conta-se que Nanã teve dois filhos. Oxumarê era o filho belo e Omulu, o filho feio. Nanã tinha pena do filho feio e cobriu Omulu com palhas, para que ninguém o visse e para que ninguém zombasse dele. Mas Oxumarê era belo, tinha a beleza do homem e tinha a beleza de todas as cores. Nanã o levantou bem alto no céu para que todos admirassem a sua beleza. (…) E lá ficou Oxumarê, à vista de todos. Pode ser admirado em seu esplendor de cores, sempre que a chuva traz o arco-íris. (Grifos meus.).

Já na cena XI (“Exu exige Ebó”), Ialorixá explica para o casal Obinrin e Okurin que Exu Elegbará[25] exige uma oferenda, para que eles possam entrar em Aruanda, seu reino. O Ebó que Exu exige é cachaça, charuto ou vela preta. Mas, por serem pobres, eles não têm nada para oferecer. No entanto, Ialorixá reafirma a necessidade da oferta. Então, para se vingar, Exu aparece e faz o casal brigar, por discordância exacerbada da cor do seu chapéu: branco ou vermelho? Por fim, o casal se separa.

Existe uma narrativa de Prandi (2001) chamada “Exu provoca a rivalidade entre duas esposas”,[26] em que as mulheres brigam justamente por causa de uma história de chapéu. Contudo, ao que parece, a Cena XI foi baseada no mito “Exu leva dois amigos a uma luta de morte”:[27] eles se matam por causa de uma discussão sobre a cor do boné do desconhecido Exu: branco ou vermelho?

Em seguida, na cena XII (“Ogun e Okunrin”), Okurin, depois da separação, perde-se nas trevas e clama por luz. Surge, então, Ogum, orixá guerreiro e caçador: “Quem te enfiou nesta cabeça oca que tu, Mortalzinho preto, mereces alcançar a luz?”[28] Mais adiante, Ogum pergunta para dois habitantes do Irê se ele estava no Reino de Irê. Como eles nada responderam, o violento orixá lhes cortou as cabeças. Dentro em pouco, Okurin informa ao deus Ogun que em dia de santo os humanos têm que ficar calados: “Ogum estremeceu, deu um berro e desapareceu chão adentro numa nuvem de fumaça”.[29]

Não restam dúvidas que esta cena foi baseada no mito “Ogum mata seus súditos e é transformado em orixá”[30].

Okurin continua pedindo luz, isto, já na cena XIII (“Camarinha” [31]). Nesse instante, aparece Ialorixá e diz que ele precisa de luz tanto por fora quanto por dentro. Assim, ela indica os passos rituais para que ele se torne um iaô, ou seja, um filho-de-santo:

IALORIXÁ: Cê tira 21 dias desta vida, cê entra pra camarinha e de lá não sai. É procê ter humildade, pra seguir a lei dos Orixás [sic]. Okurin precisa aprender a cantar rezas e cantigas da tradição. Okurin tem precisão de conhecer as ervas que curam o corpo e a alma do teu irmão. (…) Okurin vai dar bori[32] de Oxalá. Okurin vai dar a salva[33] de Obaluaê. Okurin vai dar a salva de Nanã. Ah, Muzenza! (…) Cê raspa seu cabelo. Cê lava sua cabeça nas águas de Oxalá. Cê toma banho de amaci[34] na madrugada.  (APOCALYPSE, A., 2010, p. 19.).

Finalmente, Okurin aparece vestido como um iaô: de chita, pintado de todas as cores.

Mais histórias de Exu e mitos de Xangô — “orixá do trovão e da justiça”[35] — e de Oxum — “orixá do rio Oxum; deusa das águas doces, do ouro, da beleza e da vaidade; uma das esposas de Xangô”[36] —  são encontrados nas cenas XV, XVI e XVII: “Xangô”, “Xangô e Exu” e “Prisão na Pedreira”. Em suma, Xangô quer se casar com Oxum. Todavia, ela não aceita o convite, pois do seu velho pai Oxalá precisa cuidar. Desta feita, Xangô diz que de Oxalá cuidará, levando-o em seu pescoço. Logo, o deus Xangô manda dois servos (Biri, as trevas, e Fefé, o vento)[37] buscarem um colar de contas[38] vermelhas misturadas com contas brancas. Assim que o colar chega, Xangô o pendura no pescoço e diz para Oxum que ele carrega o seu pai. Mas ela não aceita esta assertiva, pois não vê seu pai no pescoço do rei Xangô. Súbito, ele enfurece. Chega, então, Exu, para proteger Oxum e impedir que o irmão Xangô se case com ela. Os dois brigam e Exu sai derrotado. De imediato, o deus das trovoadas prende Oxum numa pedreira. Mas Exu não desiste e pede ao pai Obatalá para libertar Oxum. Logo, ela é transformada em uma pomba branca, que voa para longe.

Essas três cenas encontram referências nos mitos prandianos “Xangô vence Exu e conquista Oxum” e “Oxum transforma-se em pombo”.[39]

As cinco cenas seguintes — intituladas “Odé”, “Oxóssi”, “Katendê”, “Oxum” e “Logum Edé” — discorrem, grosso modo, sobre o amor entre o caçador Odé e a bela Oxum, e sobre a morte[40] e reencarnação de Odé: o humano Odé, “rei das matas e dos caçadores”,[41] falece e volta como o orixá Oxóssi, “rei dos índios e dos caboclos”.[42]

Assim transcorrem as ações mais relevantes destas cenas: no dia de Ifá, o Destino, Odé matou uma serpente. Entretanto, Ifá proíbe a caça em seu dia:

NARRADOR: A serpente que Odé matou, picou e comeu, é Oxumarê, filho de Nanã e Oxalá. Oxumarê, a serpente, é o arco-íris que leva água da Terra pro Céu de Olodum. Por isso Odé foi castigado. Sete anos se passaram e sete anos Oxum chorou, pedindo pra Odé voltar. Olodumaré, compadecido, perdoou Odé e permitiu sua volta a Terra como orixá: Oxóssi (…). (APOCALYPSE, A., 2010, p.27).

Por conseguinte, Oxóssi foi enfeitiçado por Katendê/Ossaim, orixá mago que “faz mágica com flores e ervas e feitiço com raízes e folhas”,[43] e ficou eternamente na floresta. Ali, Oxum vai sempre visitá-lo, murmurando carinhos e carícias em seus ouvidos.

Não obstante, com o intuito de entrar no palácio proibido para amar Oxum, Oxóssi se vestiu de mulher e se passou por sua amiga. Ficaram horas a sós: “O amor voa de Oxóssi para Oxum. […] O amor nada de Oxum para Oxóssi”.[44] Assim nasceu Logum Edé, “orixá da caça e da pesca”.[45] Mas, porque Oxóssi usou saia, Logum Edé desenvolveu-se meio homem meio mulher. Durante seis meses vive com o seu pai, alimentando-se de caça: é Oxóssi. Nos seis meses restantes vive debaixo d’água, comendo peixe: é Oxum.

Todas estas cenas esbarram nos seguintes mitos prandianos: “Odé desrespeita proibição ritual e morre”, “Oxóssi é raptado por Ossaim”, “Logum Edé nasce de Oxum e Erinlé”, “Logum Edé é salvo das águas”, “Logum Edé é possuído por Oxóssi”.[46]

Concluindo, talvez o fato de o comandante do Giramundo ter se baseado, para escrever a maioria das cenas de Os Orixás, em mitos narrados na obra Mitologia dos Orixás, de Reginaldo Prandi, e/ou também em histórias ouvidas, vistas e vivenciadas por ele no terreiro do Estrela do Oriente, ou ainda em obras lidas por ele — às quais, por algum motivo, não tivemos acesso —, gere dúvidas sobre a originalidade e autoria do texto. Mas o que realmente aconteceu foi que o dramaturgo Álvaro Apocalypse se inspirou livremente nessas referências para tecer e enredar o seu próprio entendimento dos mitos afrobrasileiros, relacionando-os com histórias acessadas em sua imaginação. Tais inspirações não configuram, de modo algum, uma terceira autoria do texto Os Orixás. Ao que tudo indica, ele pegou emprestado de Oxalá o saco da criação, semeando as sementes em forma de letras. Assim surgiram as palavras, as rimas, os pontos e os versos desse belo texto.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

APOCALYPSE, Álvaro. Os Orixás (2001). Belo Horizonte: Museu Giramundo, 2010.

APOCALYPSE, Beatriz. A era Beatriz Apocalypse no Giramundo: remontagem de Um Baú de Fundo Fundo, Cobra Norato e Os Orixás. Entrevista oral concedida a Luciano Oliveira. Belo Horizonte, 22 de jul. de 2009. Entrevista não-publicada.

ATINÚKÉ: A Cerimônia de Batismo, Nomes Yorùbá e a Concepção da Morte na Cultura Yorùbá. (Artigo). Belo Horizonte: Instituto de Arte e Cultura Yorùbá, 2009, p. 12. Disponível em: <http://www.institutoyoruba.com&gt; Acesso em: 11 ago. 2010.

BERKENBROCK, Volney J. A experiência dos orixás: um estudo sobre a experiência religiosa no Candomblé. 2. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 1999.

CARLOS, Helvécio. Álvaro Apocalypse aprofunda sua pesquisa sobre a brasilidade e mergulha nos mitos e na religiosidade africana para criar ‘Orixás’, o 30º trabalho do grupo Giramundo. Estado de Minas. Belo Horizonte, terça-feira, 08 de maio de 2001. Em Cultura.

CAMARA CASCUDO, Luís da. Dicionário do Folclore Brasileiro. 10. ed. Rio de Janeiro: Ediouro, 2000.

CARVALHO, Alexandre Magno Teixeira de. O sujeito nas encruzilhadas da Saúde: um discurso sobre o processo de construção de sentido e de conhecimento sobre sofrimento difuso e realização do ser no âmbito das religiões afro-brasileiras e sua importância para o campo da Saúde Coletiva. 2004. Tese (Doutorado em Ciências/área de Saúde Pública). Escola Nacional de Saúde Pública. Rio de Janeiro, 2004. 340 f. Disponível em: <http://bvssp.icict.fiocruz.br/pdf/carvalhoamtd.pdf>. Acesso em: 02 jul. 2010.

MALAFAIA, Marcos. Mestiçagem e culturas em Os Orixás, Cobra Norato e Um Baú de Fundo Fundo. Entrevista oral concedida a Luciano Oliveira. Escola Giramundo, Belo Horizonte, 30 de jul. de 2009. Entrevista não-publicada.

MARTINS, Alexandra. Giramundo, Saravá!  Tempo. Belo Horizonte, terça-feira, 20 de fevereiro de 2001. Magazine.

_____________________.“Os Orixás” homenageia cultura afro. Tempo. Belo Horizonte, sexta-feira, 11 de maio de 2001. Magazine – Fim de semana. p. 13.

MORAIS, Mariana Ramos de. O Candomblé na metrópole: A construção da identidade em dois terreiros de Belo Horizonte. 2006. 132 p. Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais) – Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2006.

PAULO, João. Giramundo transforma em teatro a criação do mundo narrada pelos Orixás. Estado de Minas. Belo Horizonte, quinta-feira, 21 de junho de 2001. Em Cultura/Crítica Teatro.

PRANDI, Reginaldo. Mitologia dos Orixás. São Paulo: Companhia das Letras, 2001.

RODRIGUES, Nina. Os africanos no Brasil. Revisão e prefácio de Homero Pires; notas biobibliográficas de Fernando Sales. 6. ed. Brasília: Universidade de Brasília, 1982.

SILVA, Dagoberto. Magia e rituais de Umbanda. Curitiba: A.M. Cavalcante & Cia Ltda, [196-?].

VERGER, Pierre Fatumbi. Notas sobre o Culto aos Orixás e Voduns na Bahia de Todos os Santos, no Brasil, e na Antiga Costa dos Escravos, na África. Trad. Carlos Eugênio Marcondes de Moura. 2. ed. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2000.  

 

Sites pesquisados:

 

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<http://www.fflch.usp.br/sociologia/prandi/>. Acesso em: 04 set. de 2010.

 

NOTAS:

[1] O Giramundo Teatro de Bonecos foi fundado no final da década de 1960, em Lagoa Santa, cidade da região metropolitana de Belo Borizonte. Pelas mãos firmes que seguram os remos, pelas bússolas e pelos astrolábios mágicos dos “remadores”, artistas plásticos e professores da Escola de Belas Artes (EBA) da UFMG, Álvaro Apocalypse (nascido em 1937 e falecido em 2003), Tereza  Apocalypse (nascida em 1936 e falecida também em 2003) e Maria Vivacqua Martins (nascida em 1945), a Madu, o grupo começou a girar e navegar, primeiro por Minas Gerais, depois pelo Brasil e, por fim, pelo mundo.

[2] “A organização étnica africana não é esquecida, mas não é mais o âmbito que serve de parâmetro para a organização social. O indivíduo e sua posição social têm aqui um papel mais importante que a pertença a um determinado grupo étnico. Em termos de religião, há aqui uma transferência de responsabilidade menos apoiada no grupo e mais acentuada para o indivíduo. [Logo], o culto aos Orixás, parte muito importante e ponto de apoio das religiões afrobrasileiras, não perdeu nesta transferência da África para o Brasil a sua importância e centralidade, mas perderam-se partes do culto”. (BERKENBROCK, 1999, p. 112.).

[3] Câmara Cascudo (2000, p. 606), diz que se conhece o iorubano ou nagô “como todo negro da Costa dos Escravos que falava ou entendia o ioruba. […] Abundantemente exportados para o Brasil, os nagôs tiveram prestigiosa influência social e religiosa entre o povo mestiço, conservando, com os processos de aculturação, seus mitos e tradições sacras. Localizados, em maior porção, na Bahia […], [é] o grupo negro mais conhecido em seu complexo social vivo. A persistência nagô determina o candomblé, macumba, catimbó, xangôs, sinônimo do primeiro vocábulo, reunião do seu cerimonial”.

[4] Nas citações extraídas de Verger (2000), optei por manter a grafia dos vocábulos iorubás conforme citado por ele. Assim, nos depararemos com certas palavras escritas nessa língua.

[5] Segundo Morais (2006), esse grupo pertence à nação angola, de tradição banta, cujos fiéis praticam o candomblé e também são adeptos da umbanda, religião afrobrasileira igualmente sincrética: com elementos do catolicismo, do espiritismo kardecista e das culturas indígenas e africanas. Um dos elementos comuns a essas duas religiões, dentre vários, é o culto aos orixás. E uma das diferenças está na forma de rezar. No candomblé, há um predomínio de expressões africanas. Na umbanda, as cantigas são cantadas em português.

[6] “Autoridade máxima de um terreiro (quando se trata de um homem) e dirigente do culto no Candomblé”. (BERKENBROCK, op. cit., p. 440).

[7] Ialorixá é a mesma coisa que mãe-de-santo. Todavia, no espetáculo do Giramundo, o nome Ialorixá, além de se referir à função exercida por determinada pessoa, também indica o nome de uma personagem.

[8] APOCALYPSE, Álvaro. In: MARTINS, 2001. Magazine – Fim de semana. p. 13.

[9] PAULO, 2001. Em Cultura/Crítica Teatro.

[10] NETO, Henrique. In: MARTINS, Alexandra, 2001. Magazine.

[11] APOCALYPSE, Álvaro. In: CARLOS, Helvécio, 2001. Em Cultura.

[12] Informação disponível em: <http://www.fflch.usp.br/sociologia/prandi/>. Acesso em: 04 set. de 2010.

[13] “Nos princípios”. Tradução minha realizada por meio de fragmentos encontrados no dicionário Yoruba – Português. Disponível em: <http://www.baradoloju.xpg.com.br/dicionario_yp.htm>. Acesso em: 28 de jul. 2010.

[14] Prandi, op. cit., p. 196-198 e 502-506.

[15] Oriki (saudação ou evocação) da umbanda para Oxalá: “Êpa, papai Oxalá”. Tradução minha a partir de SILVA (196-, p. 40). O oriki citado encontra-se em: APOCALYPSE, A. (2010, p. 1).

[16] APOCALYPSE, A., 2010, p. 2.

[17] Ibid, p. 3.

[18] Ibid, p. 5.

[19] Ibid, loc. cit. Itálicos meus.

[20] Ibid, p. 7.

[21] Prandi, op. cit., p. 567.

[22] Prandi (op. cit., p. 566) menciona o nome Iaô (iyawó): “esposa jovem; filha ou filho-de-santo; grau inferior da carreira iniciática dos que entram em transe de orixá”. Contudo, o nome Iawô, no texto Os Orixás, foi dado por Álvaro. Assim, parecem existir pequenas contradições nesse texto: enquanto na cena IV é mencionado que os humanos criados por Oxalá são Okurin (homem) e Obinrin (mulher), na cena XXVI o casal que é juntado por Exu é Okurin e Iawô.

[23] “Vassoura-cetro de Omulu” (ibid., p.570).

[24] Apocalypse, A., op. cit., p. 8.

[25] Prandi (2001) aponta vários nomes para Exu: Exu Bará, Exu Eleguá, Exu Legbá e Exu Elegbará. Esse fato é devido à representação deste orixá em mitos de diversas nações africanas: como, por exemplo, as nagôs e jejês.

[26] Prandi, op. cit., p. 75.

[27] Ibid., p. 48.

[28] Apocalypse, A., op. cit., p. 17.

[29]  Ibid., p. 18.

[30] Prandi, op. cit., p. 89-91.

[31] Camarinha ou roncó: “Termo pelo qual se designa o aposento destinado à reclusão dos neófitos durante o processo de iniciação. É conhecido também como aliaxé ou ariaxé, […] ou ainda axé” (CARVALHO, op. cit., p. 238.).

[32] Segundo Berkenbrock (op. cit., p. 440), bori quer dizer, literalmente: “dar de comer à cabeça. É o segundo rito no processo de iniciação no Candomblé e tem por objetivo fortalecer a cabeça do iniciando para receber o Orixá”.

[33] Saudação.

[34] Na umbanda, “o ‘amaci’ é uma infusão de ervas maceradas em água, cujo preparo obedece a preceitos rigorosos, destinada à lavagem periódica da cabeça dos médiuns”. (SILVA, op. cit., p. 66.).

[35] Ibid, p. 570.

[36] Ibid., loc. cit.

[37] Apocalypse, A., op. cit., p. 23.

[38] Fio-de-contas – “Nome dado, no Candomblé, aos colares rituais, nas cores dos orixás. Quando o colar tem 16 fios é dito dilogum, sendo arrematado com uma “firma” (conta cilíndrica) do orixá”. (CARVALHO, op. cit., p. 216).

[39] Prandi, op. cit., p. 273 e 332.

[40] “Para os Yoruba a morte não é o fim, ou melhor, a morte não representa uma extinção eterna de vida humana. Acredita-se que há vida após a morte e que [os] membros que partiram, foram para descansar. Quando os antepassados quiserem voltar para ilé ayé – o mundo, eles podem reencarnar [na] mesma família”. (ATINÚKÉ: A Cerimônia de Batismo, Nomes Yorùbá e a Concepção da Morte na Cultura Yorùbá. (Artigo). Belo Horizonte: Instituto de Arte e Cultura Yorùbá, 2009, p. 12. Disponível em: <http://www.institutoyoruba.com&gt; Acesso em: 11 ago. 2010. Para acessar este artigo é preciso fazer um cadastro no site).

[41] Apocalypse, A., op. cit., p. 26.

[42] Ibid., p. 27.

[43] Ibid., p. 28.

[44] Ibid., p. 29.

[45] Prandi, op. cit., p. 567.

[46] Ibid., p. 114, 120, 136, 137 e 140.

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